quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A Incrível Máquina de Caçar E.T's

_ Menino do céu! O que você está fazendo com a caixa de ferramentas do seu pai?
_ Espera só um pouquinho, mãe. Eu já vou guardar.
_ Guarda isso agora!
_ Tá bom, mãe... - falou o menino, escondendo um alicate e uma chave de fenda junto à engenhoca.
          Francine não sabia mais o que fazer: seu filho simplesmente não escolhia brincadeiras como as de outros meninos de sua idade, como futebol, video game. Vivia no mundo da lua, onde ajuntava todos os seres fantásticos de que ouvia falar. Certa feita, ao entrar em seu quarto, a empregada foi banhada pela "poção caça-fantasmas" que ele fez. Ela ia justamente exigir uma explicação dele sobre o que quer que fosse que ele tinha batido no liquidificador, cujo fedor não saía do aparelho. Na lista, "descoberta pelo irmão mais velho dentro de uma garrafa enterrada por um pirata", estavam itens como: olhos de sapo-boi, pernas de aranha, ovo cru, água de chuva, e uma porção de "ervas místicas". Francine arrancou um galho de goiabeira no quintal para aplicar-lhe uma bela surra, mas antes disso tinha a clássica conversa:
_ Por que você fez isso com a Marlete, Marco Túlio?
_ Eu avisei pra ela não entrar no quarto, mãe.
_ Não foi isso que eu te perguntei.
_ Eu só queria prender um fantasma na garrafa de nêutrons que eu fiz. Eu avisei pra ela que tinha uma poção em cima da porta, não era pra ela entrar.
_ Quem te disse que essa poção serve para prender fantasmas? - Ele atravessou o quarto, pegou o "pergaminho do pirata" e mostrou para sua mãe. Interessante como a letra do pirata parece a do Rafael... Deus do céu, como se não bastasse ter um filho que acredita em tudo que contam pra ele, agora tem um outro, metido a contador de histórias. Pelo menos agora ela já sabe em quem vai usar a vara de goiabeira.
_ Marco Túlio, escuta o que a mamãe vai falar: não existem fantasmas.
_ Mas o Marcelo viu um no quarto dele...
_ E quanto a você? Já viu algum?
_ Não - respondeu o garoto, com uma visível frustração.
_ Você fez isso porque está com medo de fantasmas? - "Se quiser pode dormir com a mamãe e o papai", pensou ela.
_ Não. Eu só quero ver um de verdade. - respondeu ele. A frase foi vista com certo mau agouro pela mãe.
            Desta vez o projeto do garoto era mais audacioso. Inspirado no filme E.T, o garoto resolveu inventar uma máquina que pudesse se comunicar com os E.T's através de um feixe de laser. Marco Túlio acreditava que existiam E.T's bons e E.T's maus, assim como em Startreck. O aparelho seria capaz de identificar naves amigas e inimigas, e eliminar os maus invasores. Estava quase pronta, faltava somente a eletricidade. Ele tinha providenciado tudo: conseguiu um rolo de barbante das coisas de sua mãe, embebeu em uma mistura de sal, limão e água (ele ouviu que sal e limão na água ajudam a conduzir eletricidade) e esperou secar.
            Do pé de manga até a rede elétrica de sua casa era fácil arremessar. Esperaria até o final de tarde, porque sabia que a empregada - que sempre estraga tudo - poderia descobrir sua armadilha para E.T's e "varrer" sua máquina para o lixo. Além do mais, segundo Marco Túlio, quando uma arma de laser dispara um feixe, gasta muita energia, e pode causar blecautes. O impacto seria muito menor se acontecesse à noite. Por isso, esperou até o final da tarde, quando o sol já se punha, para lançar o barbante sobre os fios. Fez o fio de barbante correr por todo o quintal, em quatro ou cinco lugares diferentes, passando pelas árvores. Quando arremessou o barbante, viu que ele encostava apenas em um dos fios.
_ Desse jeito não vai ligar. Precisa encostar em dois. - e lançou novamente o rolo por sobre os fios. Satisfeito, julgando estar com a máquina em funcionamento, foi tomar banho e dormir, conforme os gritos de sua mãe determinavam.
             A madrugada foi curta naquela noite, exceto para Marco Túlio, que vez ou outra olhava pela janela, para garantir que estava tudo certo. Por volta das quatro da madrugada, quando ele dormia um sono pesado, toda a casa acordou com um estrondo no quintal. Seu pai, Gilberto, levantou com o celular em mãos, chamando o número da polícia. Sua mãe, buscava qualquer cabo de vassoura com que pudesse acertar o que quer que fosse lá no quintal. Faltava energia, e via-se o faiscar da fiação elétrica do lado de fora.
_ Meu E.T! Peguei! - exclamou o menino.
_ Marco Túlio! Vem pra cá! - gritou a mãe, louca de desespero.
_ É o meu E.T, mãe, Consegui pegar um.
_ Que E.T, menino? Essas coisas não existem.
_ Existem sim. Acabei de pegar.
Da janela, a mãe percebia alguma coisa se movimentando no quintal. Quando a criatura se voltou para eles, ela viu claramente um rosto com olhos enormes, boca muito pequena, e que andava de um jeito esquisito.
_ Meu Deus, Gilberto! É um E.T mesmo!
_ Deixa de ser boba, mulher. Claro que não é um E.T.
_ Então vai lá pra saber o que é.
_ Não vai precisar. A polícia está a caminho.
O ser estava mancando, como se sua perna estivesse quebrada. Grunhia o tempo todo. Ficou acuado embaixo da mangueira.
_ O que é aquela coisa ali? - perguntou Gilberto, apontando a lanterna para a engenhoca de Marco Túlio.
_ É a minha máquina de caçar E.T's. Ela disparou um raio laser no E.T e paralisou ele.
_ De onde você tira essas coisas? - perguntou Rafael.
_ De lugar nenhum... Eu mesmo crio.
A criatura gemia como um ser humano.
_ Calma que a gente já chamou a ambulância! Mexe não que é pra não machucar mais! - falou Francine. O E.T resmungou, como se estivesse insatisfeito com a algeação.
_ Fica quieto, seu "Coisa"!
_ Sua perna está quebrada. Dá pra ver daqui. Mexer vai ser pior pra você. - disse Gilberto. Isso convenceu a criatura.
           Dez minutos depois da confusão a polícia chegou. Os faróis deles focaram-se todos na criatura misteriosa aos pés da mangueira. Percebendo que era a polícia, a criatura começou a se agitar:
_ Não,senhor. Não precisa vir aqui não, Senhor.
_ Põe as mãos sobre a cabeça, E.T. - disse um deles, e foi prontamente atendido. Os policiais chegaram bem perto dele, o revistaram, tomando uma arma de brinquedo, e retiraram a máscara que o meliante usava sobre o rosto.
           Marco Túlio ficou frustrado com o que viu: quer dizer que não era um E.T de verdade?
_ Esse rapaz vem praticando vários furtos à residências durante a noite. - disse o policial aos seus pais - Ele é conhecido como E.T justamente por usar esta máscara aqui. Pelo que ele estava contando para os para-médicos, quando tentou saltar o muro da sua residência, ele tropeçou num fio de barbante que passava sobre o muro, e bateu com a perna em cima do invento do seu filho. Como o barbante passava pela fiação, a queda dele fez o barbante esticar e juntar os dios fios, e isso gerou o blecaute.
_ Foi você que fez uma máquina de caçar E.T's? - pergunto o outro policial ao garoto.
_ Fui eu.
_ Parabéns: ela funciona. Este E.T pelo menos não incomoda a mais ninguém.
           Foi frustrante para o garoto ver que a máquina fora destruída de maneira tão inusitada. Mas não tinha problema algum, porque na manhã seguinte ele usaria as cadeiras velhas que a mãe ajuntou no fundo do quintal e o balanço debaixo da mangueira para fazer uma outra engenhoca: um elevador para subir em árvores.